terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Paraibanos passam fome e racionam água por causa de seca no Sertão

Dona Deló (Foto: Taiguara Rangel/G1)

Dona Deló (Foto: Taiguara Rangel/G1)

Animais aproveitam o resto de água que ainda há em alguns barreiros (Foto: Taiguara Rangel/G1)

Manoel Tavares costuma dividir a água de seu açude, mas agora a seca ameaça até a ele (Foto: Taiguara Rangel/G1)

As regiões do Cariri, Curimataú e Sertão da Paraíba são as mais afetadas pela seca que atinge o estado e registraram 62% abaixo da média histórica no seu período chuvoso, que é de 1.880 milímetros no somatório das três regiões. Entre fevereiro e maio, a análise da Agência Executiva de Gestão das Águas da Paraíba (Aesa-PB) constatou que o Alto Sertão ficou 48,6% abaixo da média, o Cariri/Curimataú registrou menos 78,9% e o Sertão com 58,7% inferior ao índice histórico de chuvas.
O homem e o gado lutam pela sobrevivência em uma das secas mais rigorosas dos últimos 30 anos na Paraíba, segundo os agricultores. Os cadáveres e ossadas dos bichos mortos de fome e sede acumulados nas estradas chegam a formar cemitérios de animais a céu aberto no Sertão do estado. Quase dois milhões de paraibanos sofrem com a falta de comida e o racionamento de água e muitas vezes tiram do próprio sustento para a sobrevivência dos animais.
Este é um dos retratos da seca que afeta os nordestinos. Na zona rural de Monteiro, no Cariri do estado, a agricultora Helena Deodato da Silva mora há mais de 40 anos no sítio Várzea Limpa. 'Dona Deló', como é mais conhecida na região, tem 77 anos e sobrevive graças à ajuda de vizinhos. Com o que resta de esperança, ela aguarda a chegada chuva.
A torturante rotina da idosa se estende desde o início do ano. A plantação está deserta onde antes havia apenas alguns pés de palma. “Seca igual a essa eu nunca enfrentei, porque antes tinha pelo menos algo para dar aos bichos. A última chuva na região foi em fevereiro, de lá para cá nem um pingo caiu. Por isso a gente não tem mais nem palma sobrevivendo nesse sol e nem consegue plantar nada porque não dá. Os vizinhos de vez em quando me ajudam. Me deram esse mandacaru, estou capinando ele para retirar os espinhos e dar ao gado”, contou a agricultora.
Seus animais estão morrendo lentamente, três já se foram somente nos últimos meses, e em seu terreno não nasce mais nada que possa servir de ração para o gado. “Tenho que ter esperança de chuva. Se não escapar dessa vez, minha vida termina por aqui. Não vou sair da minha terra. Só saio direto para o cemitério”, garantiu.
O G1 viajou 1,5 mil quilômetros cortando o interior da Paraíba, percorreu 7 cidades e acompanhou o sofrimento de paraibanos que enfrentam a seca vivenciada por habitantes dos 195 municípios que estão há quase um ano em situação de emergência, devido à estiagem.
Criadores esperam até três meses para conseguir uma única saca de ração para o gado nos armazéns da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Segundo a superintendência do órgão, existe uma conjuntura de dificuldade em âmbito nacional que dificulta o socorro aos agricultores e o racionamento de grãos não tem previsão de fim. Enquanto a maioria convive com a escassez das chuvas, o açude de Coremas, maior reservatório de água do estado, esvazia sua capacidade e está de comportas abertas para o abastecimento do Rio Grande do Norte, segundo o Departamento Nacional de Obras Contra a Seca (Dnocs).
Poços artesianos, raros açudes particulares já enlameados e carros-pipa ajudam a abastecer as comunidades. No solo ressecado, nem mesmo a palma forrageira, planta cáctea que se desenvolve na mais rigorosa das secas, está sobrevivendo. Com a falta de chuvas, agricultores na região de Patos estão dando ao gado para beber água de esgoto, oriunda do rio Espinharas.
Na zona rural de Conceição, no Sertão paraibano, pequenos açudes particulares garantem a subistência de 18 mil habitantes. “Todo mundo em Conceição vem buscar água no meu açude. Já secou muito e não tem outros. Vou esperar até o fim do mês ajudando porque gosto de todos, mas não ganho nada com isso. Quase não tem mais água nem para minha família e não vou deixar que continuem pegando água até que chova de novo, não posso fazer nada”, disse o agricutor Manoel Tavares de Menezes, de 78 anos, morador do sítio Lagoa Nova.
Um dos açudes que abastece o município de Monteiro, no Cariri do estado, está com apenas 1,6% da sua capacidade. “Esse açude só sangrou em 1986, no ano em que eu nasci. Até semanas atrás ainda vinha carro-pipa buscar água, mas agora só tem lama e ninguém tira mais nada”, agricultor Ricardo Gonçalves, 26 anos, sobre o reservatório.

Meteorologia

De acordo com a Aesa-PB, as regiões do Cariri, Curimataú e Sertão do estado são as mais castigadas pela estiagem. As chuvas registradas de fevereiro a maio foram 62% abaixo da média histórica. “Entre fevereiro e maio, a análise constatou que o Alto Sertão ficou 48,6% abaixo da média, o Cariri/Curimataú ficou 78,9% abaixo e o Sertão com 58,7% inferior ao índice histórico”, afirmou a meteorologista Marle Bandeira.
A fraca precipitação pluviométrica é comparada à intensa seca registrada em 1998, quando o clima paraibano foi afetado pelo fenômeno 'El Niño' e foi registrado 70% abaixo da média histórica. “As condições eram diferentes. Em 2012, foram as condições do oceano Atlântico Sul que estava com águas mais frias que a média. Com isso houve o desvio negativo de chuvas”, pontuou a especialista. Em dezembro a Aesa realiza reunião onde irá elaborar previsão climática para 2013.

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